Nacionais
PADRE CICERO
Nordeste reverencia hoje seu santo popular
O Nordeste se ajoelha hoje para reverenciar a memória do Padre Cícero, nos seus 165 anos de nascimento
Antônio Vicelmo - 24/03/2009

<div align="justify">Crato. Em 24 de mar&ccedil;o de 1844 nascia C&iacute;cero Rom&atilde;o Batista, que, em 90 anos de vida &mdash; faleceu em 20 de julho de 1934 &mdash; testemunhou fatos marcantes, transformando a hist&oacute;ria de um povo. J&aacute; como Padre C&iacute;cero, foi suspenso das ordens sacerdotais e quase excomungado pela Igreja Cat&oacute;lica, ao protagonizar o fen&ocirc;meno conhecido como &ldquo;Milagre de Juazeiro&rdquo;. O certo &eacute; que ele foi e continua sendo um personagem capaz de suscitar muitas pol&ecirc;micas n&atilde;o s&oacute; na Igreja Cat&oacute;lica, mas, tamb&eacute;m, no meio acad&ecirc;mico brasileiro.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Para a elite intelectual da &eacute;poca, a excomunh&atilde;o, que n&atilde;o foi oficializada porque n&atilde;o chegou ao conhecimento do sacerdote, seria &ldquo;o tiro de miseric&oacute;rdia&rdquo; na f&eacute; do povo que o tem como santo. O tiro saiu pela culatra. Perseguido, injusti&ccedil;ado e proibido de exercer o minist&eacute;rio sacerdotal, tornou-se v&iacute;tima da Igreja que ele tanto serviu com desvelo e dedica&ccedil;&atilde;o.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Na cabe&ccedil;a do homem simples do sert&atilde;o, as acusa&ccedil;&otilde;es de &ldquo;embusteiro, coronel e fan&aacute;tico&rdquo; transformaram-se num libelo em sua defesa. O padre estava sendo v&iacute;tima da intoler&acirc;ncia. Nascia ent&atilde;o o &ldquo;santo nordestino&rdquo;, cearense, cabe&ccedil;a chata, com a cara do povo, trazendo no curr&iacute;culo a mesma hist&oacute;ria de vida de milhares de sertanejos, &ldquo;sem eira nem beira&rdquo;, que ainda hoje tentam romper com as intranspon&iacute;veis barreiras dos preconceitos sociais, pol&iacute;ticos e religiosos.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">A imagem do Padre C&iacute;cero ainda n&atilde;o subiu aos altares das igrejas, mas ocupa o mesmo espa&ccedil;o dos santos canonizados nas feiras livres do sert&atilde;o. O vendedor de imagens Severino Paulino, que h&aacute; 50 anos vende quadros dos santos mais populares da Igreja Cat&oacute;lica, diz que a estampa mais vendida &eacute; a do Padre C&iacute;cero.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&ldquo;Nem mesmo o quadro do Cora&ccedil;&atilde;o de Jesus e Cora&ccedil;&atilde;o de Maria &eacute; t&atilde;o procurado quanto o do meu Padim&rdquo;, diz Severino, confessando-se ardoroso devoto do sacerdote caririense.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Hoje, 75 anos depois de sua morte, a mesma Igreja que o condenou no passado, tenta reabilit&aacute;-lo. Quando dom Fernando Panico assumiu a Diocese do Crato, em 2001, o ent&atilde;o cardeal Ratzinger &mdash; hoje, papa Beto XVI &mdash; lhe pediu que revolvesse os arquivos e pesquisasse tudo sobre o sacerdote j&aacute; canonizado pelo povo. O ponto de partida foi a forma&ccedil;&atilde;o de uma Comiss&atilde;o de Estudos para o Processo de Reabilita&ccedil;&atilde;o Hist&oacute;rico-Eclesial do Padre C&iacute;cero Rom&atilde;o Batista. No dia 30 de maio de 2006, dom Fernando entregou &agrave; Congrega&ccedil;&atilde;o para a Doutrina da F&eacute;, em Roma, cerca de 2.500 p&aacute;ginas (11 volumes) e cinco anos de pesquisas, solicitando a reabilita&ccedil;&atilde;o do sacerdote. A entrega foi acompanhada pelo Di&aacute;rio do Nordeste que enviou um rep&oacute;rter para documentar o fato hist&oacute;rico.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Tr&ecirc;s anos depois da entrega do processo, pouca coisa evoluiu. Depois que os documentos ultrapassaram os muros do Vaticano, uma cortina de sil&ecirc;ncio cobriu o assunto. Ouvido pela reportagem, dom Fernando afirmou que n&atilde;o tem nada a acrescentar. Revelou que, no m&ecirc;s de maio, voltar&aacute; &agrave; It&aacute;lia, numa viagem particular. No entanto, vai tentar colher informa&ccedil;&otilde;es sobre o andamento do processo. Antecipou, entretanto, que talvez n&atilde;o consiga nenhuma informa&ccedil;&atilde;o.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Na carta ao papa Bento XVI, por ocasi&atilde;o da entrega dos documentos &agrave; Congrega&ccedil;&atilde;o para a Doutrina da F&eacute; (e j&aacute; publicada pelo Di&aacute;rio do Nordeste em 11.6.2006), dom Fernando afirmava: &ldquo;Venho, com toda esperan&ccedil;a e humildade, suplicar a Vossa Santidade que se digne reabilitar canonicamente o Padre C&iacute;cero Rom&atilde;o Baptista, libertando-o de qualquer sombra e resqu&iacute;cio das acusa&ccedil;&otilde;es por ele sofridas&rdquo;.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Enquanto a reabilita&ccedil;&atilde;o n&atilde;o vem, o nome do Padre C&iacute;cero cresce como um dos santos mais populares do Nordeste. A pr&oacute;pria Igreja, que tratava os romeiros com indiferen&ccedil;a, abriu as portas e o cora&ccedil;&atilde;o para acolher os milhares de devotos do cearense do s&eacute;culo.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">O tom dessa mudan&ccedil;a foi dado por dom Fernando Panico em sua primeira Carta Pastoral aos diocesanos, quando afirmou: &ldquo;&Eacute; imposs&iacute;vel n&atilde;o levar em conta, na minha miss&atilde;o de Bispo de Crato, a situa&ccedil;&atilde;o muito especial da cidade de Juazeiro do Norte, que &eacute; um importante centro de romaria no Nordeste por causa da mem&oacute;ria que o povo cultiva, com muito carinho e devo&ccedil;&atilde;o, do Padre C&iacute;cero Rom&atilde;o Batista, presb&iacute;tero da nossa Diocese que merece nosso carinho, apesar de tudo o que contra ele aconteceu e se tem escrito. Desejo refor&ccedil;ar os cuidados pastorais em favor dos milhares de irm&atilde;os e irm&atilde;s, na maioria absoluta, pobres, romeiros de Juazeiro do Norte&rdquo;.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">PROCESSO NO VATICANO</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Expectativa &eacute; pela reabilita&ccedil;&atilde;o</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Crato. N&atilde;o &eacute; segredo para ningu&eacute;m que Padre C&iacute;cero, a seu tempo, foi condenado pela Igreja Cat&oacute;lica, especialmente por essa institui&ccedil;&atilde;o no Cear&aacute;. Essa condena&ccedil;&atilde;o foi um longo processo que se iniciou muito antes do famoso decreto do Santo Oficio &ndash; atual Congrega&ccedil;&atilde;o para a Doutrina da F&eacute; &ndash; de abril de 1894, que afirmava ser o sangramento da h&oacute;stia um fen&ocirc;meno v&atilde;o e supersticioso. Portanto, mentira e fraude. Ao relembrar estes fatos, a psic&oacute;loga Maria do Carmo Forti analisa que sua reabilita&ccedil;&atilde;o n&atilde;o &eacute; indiferente para os romeiros.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Padre C&iacute;cero, segundo a psic&oacute;loga, amava a Igreja Cat&oacute;lica, lutou a vida toda para reaver suas ordens sacerdotais, viveu sempre dando testemunho de seu amor a Deus, &agrave; Nossa Senhora e &agrave; Igreja. Sofreu como poucos por n&atilde;o poder viver plenamente seu sacerd&oacute;cio. O devoto, segundo Maria do Carmo, quer ver o Padre C&iacute;cero reconhecido tamb&eacute;m pela Igreja a quem dedicou sua vida.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">A psic&oacute;loga, que faz parte da comiss&atilde;o que elaborou o documento de reabilita&ccedil;&atilde;o, orienta que a Igreja reveja todo processo agora com os documentos que, por quase 100 anos, ficaram arquivados na C&uacute;ria da Diocese do Crato. Esses documentos, segundo a psic&oacute;loga, revelam os bastidores de toda hist&oacute;ria da &ldquo;quest&atilde;o religiosa do Juazeiro&rdquo; e foram estudados pela Comiss&atilde;o de Estudos para a Reabilita&ccedil;&atilde;o Hist&oacute;rico-Eclesial do Padre C&iacute;cero.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&ldquo;Foram compulsados documentos at&eacute; ent&atilde;o in&eacute;ditos; foram lidas e catalogadas centenas de cartas, cujo conte&uacute;do ningu&eacute;m conhecia antes, revelando como se deram os encaminhamentos para as decis&otilde;es tomadas, desfavor&aacute;veis ao Padre C&iacute;cero Rom&atilde;o Baptista&rdquo;, diz ainda a carta entregue no Vaticano pelo bispo da Diocese do Crato, dom Panico.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&ldquo;Portanto, &eacute; fundamental que a Congrega&ccedil;&atilde;o para a Doutrina da F&eacute; saiba, exatamente em que, em quais id&eacute;ias, pensamentos, sentimentos, ela, entre os anos 1893 a 1926, emitiu seus pareceres e decretos&rdquo;. Ao fazer esta advert&ecirc;ncia, Maria do Carmo analisa: &ldquo;&Eacute; muito prov&aacute;vel, eu pelo menos acredito nisso, que o ent&atilde;o cardeal Ratzinger tenha percebido que os documentos que constam nos Arquivos do Vaticano n&atilde;o eram suficientes para se entender o caso do Padre C&iacute;cero. Por isso seu pedido para que fossem abertos os arquivos aqui do Brasil&rdquo;.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Para Maria do Carmo, o Vaticano j&aacute; respondeu ao pedido do povo. A abertura dos arquivos da C&uacute;ria do Crato demonstra que a Congrega&ccedil;&atilde;o reagiu a esses muitos pedidos. O que a institui&ccedil;&atilde;o ainda n&atilde;o fez, nem podia faz&ecirc;-lo, segundo a psic&oacute;loga, era dar uma resposta a eles. Isso porque quem deve pedir a reabilita&ccedil;&atilde;o &eacute; o bispo da Diocese &agrave; qual Padre C&iacute;cero pertencia na &eacute;poca.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Foi o que fez dom Panico. Mas n&atilde;o s&oacute; ele, &eacute; bom que se diga. A peti&ccedil;&atilde;o para a reabilita&ccedil;&atilde;o do Padre C&iacute;cero foi assinada por 274 bispos do Brasil que, pouco antes da viagem a Roma para entrega dos documentos, estavam reunidos em Assembl&eacute;ia em Itaici, S&atilde;o Paulo.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&Eacute; a Igreja do Brasil que reconhece que a Santa S&eacute; deve considerar, com muita seriedade, esse pedido, porque o Padre C&iacute;cero merece. &Eacute; uma quest&atilde;o de fazer justi&ccedil;a para com os romeiros de Juazeiro do Norte &ldquo;visitar&rdquo; Padre C&iacute;cero e Nossa Senhora das Dores numa atitude de resist&ecirc;ncia e de f&eacute;, apesar de todas as discrimina&ccedil;&otilde;es.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&nbsp;</div>
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