Perfil
PERFIL
Nêga Mazé fala da sua luta na militância e reivindica políticas públicas para as mulheres
A entrevista da semana é com Maria José Alves do Nascimento, mais conhecida como Nêga Mazé, forte liderança comunitária e defensora do direito das mulheres em Picos.
Lana Krisna - 25/03/2009

<div align="justify"><strong>Portal O Povo: H&aacute; quanto tempo a senhora vem desenvolvendo esse trabalho comunit&aacute;rio?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Eu iniciei no trabalho comunit&aacute;rio no final da d&eacute;cada de 70, como lideran&ccedil;a no movimento de igreja na Pastoral Social da Diocese foi quando comecei a tentar no meu bairro organizar a comunidade para criar a associa&ccedil;&atilde;o de moradores. A gente incentivou para que fossem criadas em v&aacute;rios bairros de Picos, e chegamos at&eacute; Teresina com a preocupa&ccedil;&atilde;o de n&atilde;o saber como trabalhar com essas associa&ccedil;&otilde;es, nessa altura a cidade 9 delas, quando houve a id&eacute;ia de se juntar as associa&ccedil;&otilde;es do Piau&iacute; inteiro, nascendo a FAMC &ndash; Federa&ccedil;&atilde;o das Associa&ccedil;&otilde;es de Moradores e Conselhos Comunit&aacute;rios do Piau&iacute;.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: Quais foram as associa&ccedil;&otilde;es, movimentos e novidades trazidas com sua ajuda para Picos nesses anos de milit&acirc;ncia?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Nesses anos passei pelo movimento de Igreja, depois fui para o movimento comunit&aacute;rio da associa&ccedil;&atilde;o de moradores, em seguida foi surgindo o movimento negro que inclusive tive a felicidade de estar colaborando como coordenadora da assembl&eacute;ia geral para que fossem criados os movimentos UNEGRO e a OCN. Quando voc&ecirc; entra em um movimento vai descobrindo a necessidade de se especificar a luta por categoria e assim os movimentos v&atilde;o surgindo e cada qual vai pegando as suas bandeiras espec&iacute;ficas, eu at&eacute; gosto de dizer que a FAMC teve esse incentivo para que surgissem outros movimentos, como o de mulher, crian&ccedil;a e adolescente. Depois de passar pelo Conselho Tutelar, onde fui a conselheira mais eleita em Picos, depois priorizei movimento de mulher considerando que havia uma necessidade muito grande em se combater a viol&ecirc;ncia dom&eacute;stica, surgindo a luta pela delegacia da mulher, outra conquista. Mas a lideran&ccedil;a comunit&aacute;ria n&atilde;o pode se dar o luxo de priorizar um movimento.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: Nesses dez anos frete ao movimento a favor da mulher, quais foram os grandes embates e quais foram as grandes conquistas?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">O embate maior que a gente sentiu foi a cria&ccedil;&atilde;o da Delegacia da Mulher na lei Maria da Penha que foi uma grande mobiliza&ccedil;&atilde;o no Brasil inteiro pela sua aprova&ccedil;&atilde;o, e no momento o grande embate &eacute; a aplica&ccedil;&atilde;o dessa lei. Para a devida aplica&ccedil;&atilde;o n&atilde;o &eacute; necess&aacute;rio s&oacute; a delegacia, mas os juizados especiais, o SOS Mulher, uma equipe multidisciplinar, uma casa de apoio para as v&iacute;timas da viol&ecirc;ncia, estas s&atilde;o todas essas dificuldades que temos pela frente para implementarmos de fato a lei Maria da Penha. Mas n&atilde;o posso deixar de falar de outro grande problema, o n&uacute;mero crescente de estupros a menores e adolescentes, onde n&atilde;o est&aacute; sendo decretada a pris&atilde;o preventiva desses elementos que cometem o estupro, ent&atilde;o acho que a sociedade precisa se organizar mais para que possamos combater isso.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: Recentemente um membro da Pol&iacute;cia Militar do Piau&iacute; comentou em alguns meios de comunica&ccedil;&atilde;o que a lei Maria da Penha existe, mas n&atilde;o est&aacute; sendo cumprida, quando a policia chega ao local para efetuar a pris&atilde;o do companheiro agressor a esposa retira a queixa. O que est&aacute; faltando?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Se a lei existe, ela deve ser aplicada, se a pol&iacute;cia chega e pega em flagrante sua grande obriga&ccedil;&atilde;o &eacute; obedecer &agrave; lei, prender.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: E nos casos em que a pol&iacute;cia n&atilde;o faz o flagrante, e a mulher acaba retirando a queixa por n&atilde;o desejar que o seu companheiro, mesmo agressor, seja preso?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">Falta ainda conscientiza&ccedil;&atilde;o para muitas mulheres, mas isso s&oacute; acontece porque a mesma se sente sem apoio, ela na tem uma Casa Abrigo onde possa ficar com seus filhos, ela n&atilde;o tem uma pol&iacute;tica de emprego e renda que possa apoi&aacute;-la, a mulher n&atilde;o tem nada e &eacute; vulner&aacute;vel na m&atilde;o dos batedores, porque a &uacute;nica prote&ccedil;&atilde;o que tem &eacute; na m&atilde;o do batedor. Ent&atilde;o &eacute; bom que a sociedade acorde e ao inv&eacute;s de ficar usando desculpas para n&atilde;o prender batedor, veja a necessidade de se criar prote&ccedil;&atilde;o a mulher. Como &eacute; que a mulher pode querer prender seu esposo se a pol&iacute;cia prende hoje e a justi&ccedil;a solta amanh&atilde;, sem falar que de cem se prende um. Ent&atilde;o como &eacute; que mulher pode estar segura em uma situa&ccedil;&atilde;o dessas? Se n&atilde;o tem juizados especiais que priorizem seu caso para que o processo ande? E quem vai dar comida para as crian&ccedil;as? Ou seja, uma s&eacute;rie de situa&ccedil;&otilde;es envolve a justi&ccedil;a, o poder p&uacute;blico e a pouca conscientiza&ccedil;&atilde;o que faz com que a mulher retire a queixa.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: A senhora passou boa parte da sua vida defendendo os direitos das pessoas, hoje est&aacute; na academia cursando Direito, de onde partiu esse desejo?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">&Agrave;s vezes fico preocupada considerando o avan&ccedil;o da minha idade, mas quero dar esse est&iacute;mulo &agrave;s pessoas de que enquanto a gente estiver vivo, temos que estar lutando. O meu est&iacute;mulo veio da necessidade e da ignor&acirc;ncia da nossa comunidade, a dificuldade em entender os seus direitos, saber o que o &ldquo;Doutor&rdquo; fala. Ent&atilde;o espero que n&atilde;o s&oacute; eu, mas essa nova gera&ccedil;&atilde;o que est&aacute; saindo dos cursos de direito tenham essa responsabilidade com os movimentos sociais, como as quest&otilde;es sociais, para que a gente esteja de fato tirando as nossas leis do papel. Minha preocupa&ccedil;&atilde;o vem de estar junto ao povo sentindo essa necessidade, eu n&atilde;o tenho muito tempo, mas o pouco que tenho quero usar para entender as coisas e poder ajudar na comunidade.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: Como a senhora avalia atualmente os movimentos comunit&aacute;rios na cidade de Picos?</strong></div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify">N&oacute;s estamos com um problema na cidade de Picos, e acho que ele est&aacute; na pr&oacute;pria conjuntura. N&oacute;s passamos a vida toda no confronto contra o poder, achando que eles eram nossos advers&aacute;rios, essa era a nossa id&eacute;ia. Agora que o Partido dos Trabalhadores ganhou, e n&oacute;s chegamos ao poder foi um impacto, ent&atilde;o houve uma parada porque o movimento se assustou, estamos nos levantando e achando um caminho pra gente andar dentro do nosso pr&oacute;prio governo.</div> <div align="justify">&nbsp;</div> <div align="justify"><strong>Portal O Povo: Momento aberto para mais algum coment&aacute;rio...</strong></div> <div align="justify"> <p>N&atilde;o me arrependo e nem me arrependi, &eacute; um trabalho comunit&aacute;rio, &eacute; um trabalho volunt&aacute;rio e em termos de bens materiais n&atilde;o consegui juntar nada. Mas consegui juntar muitas amizades, a credibilidade e me tornar uma pessoa popular e amada pelas pessoas de Picos, elas acreditam em mim e eu acredito nessas pessoas e isso me faz sentir muito bem, se fosse pra come&ccedil;ar de novo, eu come&ccedil;aria novamente.</p> </div>
Facebook
Publicidade