Rosa Luz fala sobre culinária, livros e futebol...
Filha de Picos, nascida no Baixio Ipueiras em 7 de janeiro de 1947 a professora aposentada fala sobre os projetos para uma cooperativa de culinária
<div align="justify"><strong>Qual o grande diferencial e potencial da culinária Picoense?</strong></div>
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<p>A nossa culinária é riquíssima, mas foi se perdendo durante o tempo, é feita com produtos da terra, e não importados. Muitas pessoas se utilizam desses pratos, mas nem sabem que os mesmos fazem parte da histórica cozinha picoense, como o baião de dois, a paçoca, Maria Izabel, os doces, bebidas como o aluá, sabores que morreram para algumas pessoas, mas que eu não deixei ser esquecido.</p>
<p><strong>A senhora vem desenvolvendo um trabalho de reconhecimento de bebidas e comidas típicas da região de Picos, o seu interesse é criar uma cooperativa para expansão nesse segmento?</strong></p>
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<p>O meu interesse não é para mim, é para os outros, quero ensinar as pessoas que tenham o seu produto em casa, seja na chácara, no roçado, e que não saibam se utilizar desse produto. Eu quero ensinar as pessoas a usar a criatividade para criar novos pratos, e assim se alimentarem de maneira mais saudável, e se for o caso, comercializar o produto feito com os frutos da terra, o que pode melhorar o rendimento familiar, seja através de cooperativas ou associações.</p>
<p><strong>O objetivo é estudar os alimentos da região?</strong></p>
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<div align="justify">Sim, como exemplo posso citar a bebida, eu faço o licor e fico testando os produtos que temos na região, e está dando certo, como o licor de hortelã, seriguela, carambola, pequi, buriti, umburana, são quase 40 sabores de licor oriundos da nossa terra.</div>
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<p><strong>Entre as receitas inventadas pela senhora, quais é possível destacar?</strong></p>
<p>Entre as receitas criadas tenho o bolo de tamarindo, o bolo de capim santo com raspa de laranja e iogurte, quatro bolos diferentes a base do umbu cajá, assim como receitas da carambola, do gergelim, inclusive estou me preparando para registrar essas receitas, e em seguida enviar a do bolo de tamarindo para o programa da Ana Maria Braga.</p>
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<div align="justify"><strong>A senhora sente dificuldades para dar prosseguimento a esse estudo em Picos?</strong></div>
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<p>Sinto. Como esse projeto não vai render para as pessoas que o ajudarem, e sim para os ajudados, seria muito bom encontrar alguém que quisesse investir. A finalidade é ajudar aos outros. O empecilho é o fato de eu não poder dar aula, para ministrar cursos, ou simplesmente dar aula de culinária, para isso é preciso já ter passado por um curso de formação, nunca consegui fazer um curso de culinária dentro da minha cidade, sou autodidata, todo meu conhecimento foi adquirido ao longo da vida, não tenho nenhum curso que me qualifique para tal.</p>
<p><strong>Como a senhora aprendeu a cozinhar, e como surgiu essa paixão pela cozinha? </strong></p>
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<p>A minha família traz isso na tradição, a minha mãe, que é descendente de cearenses já usava todos esses ingredientes, e eu fui aprendendo, a partir dos 10 anos de idade ela me pôs na cozinha para ir vendo como ela trabalhava, aprendi, depois que me aposentei uso isso como hobby, já que não temos espaço em outros lugares, eu criei meu próprio espaço de estudo.</p>
<p><strong>Mesmo tendo ido para cozinha aos 10 anos, a senhora traçou um caminho diferente e buscou independência financeira, como foi sua experiência na sala de aula?</strong></p>
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<div align="justify">Ser professora não foi o que eu escolhi, foi o que meu pai escolheu, eu queria fazer medicina, mas ele não deixou e me colocou num internato para ser professora, diante disso não fui me revoltar, pelo contrário, assumi com responsabilidade e se perguntarem para os meus alunos saberão quem foi Rosa Luz na sala de aula, sou suspeita, mas até hoje os meus alunos são meus amigos.</div>
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<p><strong>Como a senhora avalia as mudanças da sala de aula antes e agora?</strong></p>
<p>Estou afastada há 19 anos, fui professora, coordenadora e diretora, o que eu ouço é que o professor de hoje não é como nós aquela época, dizem até que se eu fosse para a sala de aula hoje, eu não daria aula, por que eu era muito dura, exigia demais e hoje alguns alunos não querem aprender.</p>
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<div align="justify"><strong>Nessas duas épocas, como a senhora vê a valorização do profissional professor?</strong></div>
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<p>Na época em que eu comecei o salário do professor era muito bom, foram desvalorizando o valor que recebíamos, mas hoje os professores tem mais oportunidade, a existência de muitos cursos e especializações contribui para a valorização. Na época não cheguei a concluir o curso superior, o que não me impediu de dar aula até o científico, hoje ensino médio.</p>
<p><strong>Além de professora, a senhora também foi destaque a nível estadual e nacional como primeira mulher a dirigir um time profissional de futebol, como foi essa experiência?</strong></p>
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<p>Foi nos anos de 1995 e 1996, uma experiência muito boa, porque de futebol muita gente dizia que eu só sabia que a bola era redonda, um engano. Quando estudei no Crato eu era fã do Icasa e não perdia um jogo, e no colégio que eu estudava tinha uma quadra com futebol de salão toda quinta-feira, então eu vivia dentro desse esporte e passei a gostar. Assumi a presidência da SEP e foi muito bom, por onde passei deixei a marca de uma mulher com a mão de ferro, na época não tive apoio nem das mulheres e nem dos homens, nós andávamos pedindo esmolas para viajar, para pagar os jogadores, a se eu pegasse a SEP de hoje com o dinheiro que o time tem para trabalhar.</p>
<p><strong>Quais foram as dificuldades?</strong></p>
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<p>Quanto ao tratar de ser aceita pelos jogadores não tive problema, fui bem aceita na Federação e bem tratada e cuidada em qualquer lugar onde cheguei com os meus jogadores, é claro que existem aquelas pessoas que sempre são contra.</p>
<p><strong>A senhora se considera uma mulher a frente do seu tempo?</strong></p>
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<p>Desde quando nasci eu sempre fui além. Imagine em 1964, quando Picos não tinha nem o 2° grau e eu já queria fazer medicina. Naquele tempo não tínhamos jornais e poucos rádios e eu já pensava diferente, mas acabei ficando por Picos e até hoje não descobri qual é a minha missão nessa cidade. Era pra eu ter estudado muito, porque é o que eu sonhei e sonho ainda.</p>
<p><strong>Como filha de Picos, como a senhora avalia a cidade nos dias atuais?</strong></p>
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<div align="justify">A cidade era mais pacata, hoje ela tem muito trânsito, gente chegando de todos os lugares, agora a cidade em si está sendo bem administrada, é difícil para o administrador por que ela cresceu muito rápido e vem carregando problemas de outros tempos. Picos deveria ter mais atrativos para o seu tamanho, a parte cultural e o artesanato deixa a desejar.</div>
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<p><strong>Além de ser professora e gostar de culinária, a senhora é membro fundador da Academia de Letras da Região de Picos, como foi essa experiência?</strong></p>
<p>No início fui procurada por escritores de Teresina para fundar uma academia. Juntei-me com outros grupos de Picos e demos um pontapé inicial, sem minha autorização me elegeram como presidente, mesmo renunciando, fui obrigada a assumir pela unanimidade da eleição. Sobre os objetivos da academia sou sincera, eles não estão sendo aplicados como deveriam ser, é preciso ser feito um trabalho fora, nas escolas, com a sociedade primando pela língua portuguesa. Atualmente o trabalho está muito restrito a lançamento de livros, e o lançamento é uma conseqüência do trabalho que se faz fora da academia, nas escolas, universidades, portanto me afastei.</p>
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<p><strong>Quais são os seus livros em preparação?</strong></p>
<p>Tenho um livro de fotografias que contará com as poesias sob a ótica das minhas fotos, um de culinária a nível nacional, desde a mandioca dos índios até as pizzas de hoje e terceiro que foi desmembrado deste último, tratando sobre a culinária picoense, que será mais acessível a todos.</p>
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<p><strong>Picos é uma cidade carente de escritores, ou não existe incentivo?</strong></p>
<p>Autores têm muito, temos muita gente boa, o que falta é incentivo pela secretaria de educação, de cultura, pelo poder municipal, estadual e federal também. Não só na literatura, mas em outras artes. Existe certo descaso, e falo não para agradar gregos e troianos, a verdade é essa.</p>
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<p><strong>Entre Futebol, Livros e Culinária, qual deles ocupa mais espaço no seu coração?</strong></p>
<p>O que está ocupando mais espaço no meu coração e tem me transformado em cientista ultimamente é a culinária, o jogo dos ingredientes. Esse prazer tem me deixado altamente realizada. Queria que muita gente viesse conhecer, a minha casa está aberta para todas as pessoas que tenham esse interesse, que queiram conhecer essa arte.</p>
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