CULTURA
COMÍCIO DO LIVRO
(oração de abertura da 36ª Feira do Livro de Pelotas)
Joaquim Moncks Publicado no Recanto das Letras - 31/10/2008

<div align="justify">Estamos aqui, em pra&ccedil;a p&uacute;blica, &agrave; sombra do tempo vivido e sob o olhar do tempo presente. Lambidos de esperan&ccedil;as no porvir. Olhos fixos no futuro. Desejosos de felicidade e de amor.<br /> <br /> O momento &eacute; solene, porque tratamos de p&aacute;tria perpetuada, fugindo do ber&ccedil;o espl&ecirc;ndido, antevisora de futuros, do bem-comum e do bem-viver. No m&iacute;nimo, alguma perspectiva para a na&ccedil;&atilde;o em desenvolvimento, num mundo sem rosto, porque o capital n&atilde;o tem p&aacute;tria, nem mem&oacute;rias altru&iacute;stas.<br /> <br /> Maior na&ccedil;&atilde;o atual do idioma portugu&ecirc;s, ressonam em n&oacute;s as assacadilhas dos conquistadores sobre os gentios socavados de pau-brasil: Pindorama, p&aacute;tria e fam&iacute;lia bastarda, explorada pela gan&acirc;ncia de ouros e pratas. De antanho, e hoje com a cobi&ccedil;a dos Imperadores destes tempos a tentar dividir o mundo tupiniquim. De Amaz&ocirc;nias e alguns alhures do mundo dos remanescentes ianom&acirc;mi. A cara deslavada da mentira ati&ccedil;a os Calabares e os Joaquins Silv&eacute;rios de todos os tempos.<br /> <br /> A Primavera &ndash; com os seus jacarand&aacute;s em flor &ndash; ado&ccedil;a o tempo de viver e ratifica que estar vivo &eacute; uma condena&ccedil;&atilde;o ao pensar para os privilegiados do senso de cultura universal. O brasileiro &eacute; um resistente...<br /> <br /> &Agrave; nossa volta o Homem e sua hist&oacute;ria. Nossos olhos esbugalhados de passados admiram o maior conjunto arquitet&ocirc;nico neocl&aacute;ssico da Am&eacute;rica Latina. O Teatro Sete de Abril, imponente, observa a tudo com o olho cicl&oacute;pico das emo&ccedil;&otilde;es.<br /> <br /> A riqueza do trabalho humano bem administrado produziu o ciclo do charque e suas benesses materiais. Quase duzentos anos nos separam do auge desenvolvimentista do s&eacute;culo XIX. E aqui chegamos com o rescaldo do inc&ecirc;ndio e da bancarrota econ&ocirc;mica dos anos 30 do s&eacute;culo XX, na Zona Sul do Estado.<br /> <br /> Mais uma vez fala o meu cora&ccedil;&atilde;o antigo. Emocionado, olhos mareados de ventos que sopram uma &uacute;nica vez e depois &eacute; o grande Nada do instante que j&aacute; &eacute; passado.<br /> <br /> &ndash; Digo, digo que digo, o que era mesmo que eu queria dizer?<br /> <br /> Quiseram os meus conterr&acirc;neos que o poeta-soldado viesse &agrave;s pra&ccedil;as de inf&acirc;ncia e de adolesc&ecirc;ncia saudar o objeto mais importante na dimens&atilde;o humana, o esqu&aacute;lido e desajeitado objeto: o templo das mem&oacute;rias.<br /> <br /> O livro como objeto; o livro como registro; o livro como mensagem. O livro &eacute; a tentativa de resist&ecirc;ncia contra a morte. Do homem e de sua condena&ccedil;&atilde;o no tempo. Muitos viveram e morreram por id&eacute;ias, por ideais constru&iacute;dos pela necessidade de compartilhar descobertas havidas com os seus bot&otilde;es.<br /> <br /> &ndash; Enfiadas que nem piolho em costura! Diriam os que apenas ouvem a hist&oacute;ria prolet&aacute;ria de pai pra filho ou os que v&ecirc;em e ouvem a pot&ecirc;ncia globalizante das mensagens televisivas das cadeias de comunica&ccedil;&atilde;o social, mormente as tev&ecirc;s, e que vendem todo o tipo de bugigangas e indulg&ecirc;ncias.<br /> <br /> O livro, num pa&iacute;s em que a m&eacute;dia de leitura &eacute; de apenas 3,8 livros/habitante ano, &eacute; um objeto desconhecido da maioria da popula&ccedil;&atilde;o.<br /> <br /> Estamos no Rio Grande, o Brasil meridional, em que o esfor&ccedil;o de professores, ativistas culturais, autores e livreiros &ndash; 53 Eventos do Livro na capital e 35 Feiras do Livro aqui em Pelotas &ndash; a par de uma corrente desencadeadora de iniciativas culturais, produziram o &iacute;ndice de 5,6 livros/habitante/ano. E transitamos o in&iacute;cio do terceiro mil&ecirc;nio com a esperan&ccedil;a de que o cidad&atilde;o possa vir a ser dono de seu pr&oacute;prio destino, de sua mem&oacute;ria e do registro de sua pr&oacute;pria hist&oacute;ria.<br /> <br /> Eu me sinto um instigador, um provocador a que se pense sobre tal ou qual. Quase nunca sobre coisa pr&aacute;tica, porque esta sempre &eacute; o resultado da a&ccedil;&atilde;o conseq&uuml;ente de uma idea&ccedil;&atilde;o. &Eacute; na id&eacute;ia em que assesto a minha seta. Honrado pela escolha, consciente de meu papel, trafego no olho da agulha.<br /> <br /> O poeta, o intelectual, o ativista das palavras, tem o desafio de lidar com id&eacute;ias, por isto trabalha com met&aacute;foras, com o centro desafiador da a&ccedil;&atilde;o humana. Desencadeia a possibilidade de achar solu&ccedil;&otilde;es. Trabalha-se com o mist&eacute;rio da Palavra.<br /> <br /> Particularmente, divido a humanidade entre os que s&atilde;o e os que t&ecirc;m. Os que s&atilde;o mudam os destinos do mundo. Meros quixotescos lanceiros contra p&aacute;s de moinhos confundidas como fossem drag&otilde;es, tal construiu para a vida o cavaleiro Miguel de Cervantes, em seu Dom Quixote, h&aacute; mais de trezentos anos. Aos que t&ecirc;m n&atilde;o interessam mudan&ccedil;as porque perdem privil&eacute;gios.<br /> <br /> Venhamos aos livros. O mundo n&atilde;o mudar&aacute; enquanto id&eacute;ias n&atilde;o criarem pernas para andar por si s&oacute;s. Mas j&aacute; &eacute; um come&ccedil;o de trajet&oacute;ria.<br /> <br /> Salve Pelotas, minha terra! Que os tempos andejos e os seus cavaleiros andantes produzam homens e mulheres mais felizes de p&aacute;tria, amores e fam&iacute;lias.<br /> <br /> Salve os passageiros do Tempo! Estamos abrindo as portas ao Futuro! O livro pode n&atilde;o ser um portal para o dia seguinte. Mas &eacute; sementeira.<br /> <br /> Colhamos os frutos nas bancas, nos balaios de ocasi&atilde;o, des&ccedil;amos os neur&ocirc;nios das prateleiras do conformismo.<br /> <br /> O livro &eacute; sempre um grande companheiro de estrada. E pode conter, tamb&eacute;m, o ouro, a prata e o petr&oacute;leo.<br /> <br /> Como escolher dirigentes l&uacute;cidos, se n&atilde;o a partir do conhecimento e da informa&ccedil;&atilde;o sobre os seus projetos? Quem n&atilde;o se acostumou com a leitura e a pesquisa desde muito cedo ter&aacute; como discernir e agir no sentido do projeto compartilhado para o Coletivo?<br /> <br /> Num pa&iacute;s de Educa&ccedil;&atilde;o destro&ccedil;ada, h&aacute; muito a ser feito em conjunto com o vetor Cultura. Por isto mesmo, os ativistas culturais s&atilde;o tipos humanos muito especiais.<br /> <br /> Congeminemos a educa&ccedil;&atilde;o e a cultura em todos os nossos atos enquanto agentes l&uacute;cidos e reprodutivos. Produziremos, no m&iacute;nimo, um homem ou uma mulher, ambos mais felizes. Porque este &eacute; o destino &uacute;ltimo da criatura humana: o ser feliz!<br /> <br /> Que bom que os livros chegassem mais baratos &agrave;s m&atilde;os dos necessitados da Palavra, da fic&ccedil;&atilde;o e da informa&ccedil;&atilde;o cient&iacute;fica. Num Brasil que l&ecirc; diminutamente, as edi&ccedil;&otilde;es s&atilde;o pequenas e se tornam caras para o bolso do consumidor.<br /> <br /> Mas, enfim, todo o ato objetivo de cidadania tem alto custo para o esp&iacute;rito ou para o bolso.<br /> <br /> Adentremos ao universo da fantasia, das barracas livreiras e dos eventos l&iacute;tero-culturais. Adentremos ao portal da Esperan&ccedil;a e do Porvir.<br /> <br /> Aprendamos com os livros: errar por a&ccedil;&atilde;o, nunca por omiss&atilde;o! &ndash; para o livro O H&Aacute;LITO DAS PALAVRAS, 2008. http://recantodasletras.uol.com.br/artigos/1258247</div> <div align="justify">Joaquim Moncks Publicado no Recanto das Letras em 31/10/2008</div> <div align="justify">&ldquo;Esta obra est&aacute; licenciada sob uma Licen&ccedil;a Creative Commons. Voc&ecirc; pode copiar, distribuir, exibir, executar, fazer uso comercial da obra, desde que seja dado cr&eacute;dito ao autor original (Joaquim Moncks). Voc&ecirc; n&atilde;o pode criar obras derivadas.</div> <div align="justify">&nbsp;</div>
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